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Sexta-feira, Novembro 22, 2024

A Prática ESG na Incorporação Imobiliária

A Prática ESG na Incorporação Imobiliária

por Alexandra Monteiro*

A sigla ESG, em inglês, significa Environmental, Social and Governance. Isto é, em português, seria mais apropriado se falar em ASG para as palavras Ambiental, Social e Governança. No Brasil e no mundo, as discussões acerca do tema têm se multiplicado, uma vez que os grandes investidores e gestores de fundos estão buscando por ativos (empresas e negócios) que estejam, de fato, alinhados com tais questões e bem classificados nos fatores de responsabilidade ambiental, social e governança corporativa.

Cada vez mais, a preservação do meio ambiente e dos recursos naturais (finitos) está sendo debatida pelos principais países do globo, com especial atenção para o compromisso das nações com a redução da emissão de gases de efeito estufa, conforme Acordo de Paris, a fim de que sejam mantidas boas condições de vida e produção no futuro para as próximas gerações. 

Como praticamente todas as atividades produtivas estão conectadas a algum tipo de degradação da natureza, as empresas se tornaram possíveis alvos de críticas e julgamentos se não voltarem seus objetivos e metas para esse fim. 

Além disso, desde sempre, falar em sustentabilidade inclui também questões sociais, e não somente ambientais. Logo, faz parte das discussões entre gerações o bem-estar da sociedade através da inclusão (no sentido mais amplo desta palavra) e da busca por equidade de oportunidades entre todos na cadeia produtiva. 

Pode-se perceber que a pandemia – e seu impacto socioeconômico devastador em todo o mundo – consolidou a cultura da sustentabilidade no ideário contemporâneo, além do grande apreço das novas gerações pelo tema. Assim, daqui para frente, as empresas e negócios que não estiverem alinhadas com tais preceitos, correrão o risco de perder investimentos a médio e longo prazo. Sem contar que poderão ter maior dificuldade de adaptação a novas leis e regulações (nacionais e internacionais) que estiverem por vir neste sentido e, com isto, se apresentarem mais vulneráveis a multas e sanções em diversas esferas.

Ao perceber tais tendências, investidores e gestoras de fundos globais passaram a dar maior importância para os critérios ESG. Uma pesquisa do UBS BB Global Banking com mais de 5 mil investidores mostrou que 70% gostariam que seus investimentos fossem alinhados a valores sustentáveis. (Fonte: O Estado de São Paulo, 04/07/2021) Logo, as empresas deverão adequar suas políticas e práticas ambientais, sociais e de governança para atender a essa expectativa dos donos do capital. Restando claro que há a necessidade de mudanças reais no posicionamento e atuação das companhias, pois não se trata de cumprir as leis vigentes, mas sim de ir além, fortalecendo sua imagem na sociedade, gerando valor para atrair e reter consumidores e, mais que isso, para reter talentos entre seus quadros de colaboradores também.

Assim, é mais que chagada a hora do mercado de incorporação imobiliária também voltar sua atenção para esse assunto, uma vez que a atividade requer forte captação de investimentos externos para se desenvolver e muitas das grandes empresas do setor possuem capital aberto. No entanto, enquanto práticas ESG são quase que congênitas nas startups, grandes e médias empresas de outros segmentos também já atuarem fortemente nesta linha, e apesar de tantas discussões e fóruns sobre o tema no país, ainda se vê entre as incorporadoras imobiliárias, com raras exceções, uma certa inércia diante da nova realidade, que fatalmente, mais cedo ou mais tarde será imposta a este mercado. 

Mas, objetivamente, quais fatores interessam para que as companhias se alinhem aos princípios ESG desejados para os investidores? Em linhas gerais, é possível elencar alguns pontos centrais que devem ser considerados para tal propósito:

1. Em relação aos fatores ambientais (“E”):

• uso consciente dos recursos naturais;

• controle da emissão de gases nas atividades;

• eficiência energética;

• controle dos níveis de poluição;

• tratamento de resíduos;

• preocupação com a preservação da biodiversidade.

É sabido que a construção civil utiliza grande quantidade de recursos naturais e gera enormes volumes de resíduos que não são reaproveitados no ecossistema. Segundo a UNEP – United Nations Environment Programme – o setor da construção civil foi responsável por 38% das emissões globais de CO2 em 2019. No Brasil, é mínimo o controle de emissão de gases estufa e poluição por esta atividade, que ocorre basicamente em canteiros de grandes obras com alguma certificação ambiental. E as incorporadoras, como responsáveis pelo negócio perante os investidores e clientes finais, em breve passarão a ser cobradas mais fortemente por isto pelos agentes financeiros em seus empreendimentos. 

2. No fator social (“S”), possuem relevância:

• políticas e relações de trabalho dentro da empresa;

• programas de inclusão e diversidade;

• relações de suporte à comunidade;

• busca e incentivo à inovação;

• cuidado à saúde dos funcionários;

• segurança de dados.

Atualmente, a questão da inclusão é um tema central nos debates acerca do mundo corporativo. Entretanto, ainda é possível perceber o quanto o setor da incorporação imobiliária e da construção civil ainda atuam de forma muito tímida em relação ao tema.

Exemplo disso é que, olhando para a atuação de engenharia civil, o gênero feminino ainda ocupa cerca de 13,6% dos postos de trabalho registrados, ante os 86,4% do gênero masculino, segundo dados do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (CONFEA).

Inclusão e diversidade estão no centro das discussões sociais das políticas ESG, e as incorporadoras e construtoras precisam acirrar seus esforços para terem quadros de colaboradores mais heterogêneos, olhando tanto para a questão de equidade de gênero, quanto para suas políticas de inclusão voltadas para aumentar o número de profissionais negros e portadores de necessidades especiais (PNE) em seus escritórios. 

É algo intuitivo, mas uma profusão de estudos tem comprovado que empresas que investem na diversidade de suas equipes conjugam mais conhecimentos e habilidades, repertório emocional e margem de acesso a novos mercados, com ganhos significativos em relação a empresas com quadros homogêneos. O Fórum Econômico Mundial estima um aumento de 25% a 36% na lucratividade; 20% nas taxas de inovação; e 30% na habilidade de identificar e reduzir riscos nos negócios. (Fonte: O Estado de São Paulo, 22/06/2021)

3. Por fim, os critérios de governança (“G”) incluem:

• independência do conselho administrativo;

• política de transparência para líderes;

• diversidade na composição do conselho;

• comitês qualificados de auditoria;

• responsabilidade fiscal;

• políticas rígidas de compliance;

• garantia dos direitos dos acionistas.

Nesse quesito, em uma rápida pesquisa, analisando uma lista de 23 incorporadoras de São Paulo que aparecem na relação das maiores da Embraesp (ano base 2020), vê-se que apenas 34% destas – isto é, apenas 8 – possuem mulheres entre os membros do Conselho de Administração. E, ao se analisar os números absolutos de cargos de Diretoria Executiva, apenas 5% são ocupados por mulheres. Ou seja, a disparidade de gênero nestas posições de liderança é muito grande e evidente.

Na mesma base, analisando a questão da inclusão racial, verifica-se também um problema de representatividade muito sério, pois menos de 1% dos cargos de Conselho de Administração e Diretoria Executiva das incorporadoras pesquisadas são ocupados por negros**. 

Importante colocar que já existem algumas incorporadoras e construtoras do mercado se estruturando ao redor do ESG, mas ainda são poucas. E, nesse sentido, há que se deixar claro, que políticas e práticas ESG precisam ter objetivos a serem cumpridos em curto, médio e longo prazo, com KPIs que serão utilizados para medir sua efetividade, justamente para que as intenções não sejam apenas discurso desconexos da realidade.

A união entre empresas e organizações do terceiro setor pode fortalecer e acelerar o processo de implementação de protocolos ESG no mercado da incorporação imobiliária e, também, da construção civil no país. E, neste sentido, as Associações e Sindicatos têm papéis importantes, podendo atuar como pontes entre estes dois lados e fomentar o debate sobre sustentabilidade ambiental, inclusão e diversidade.

Além disso, sem que CEOs e Conselhos de Administração não se envolvam genuinamente com as mudanças, a agenda ESG não terá espaço no setor. No entanto, como dito anteriormente, logo esta não será uma escolha, mas sim, uma imposição dada pelos investidores e, também, pelos consumidores. Então, quanto antes o ESG apareça como uma prioridade na incorporação imobiliária, melhor para todos.

*Alexandra Monteiro é arquiteta, gestora de incorporação imobiliária e autora do livro “Incorporação Imobiliária – Planejamento e Gestão na Prática”.

**Informações levantadas nos canais oficiais de Relacionamento com Investidores das empresas.

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